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quinta-feira, 31 de maio de 2012

A possibilidade de arguição de prescrição pela via da Exceção de Pré-Executividade na Execução Fiscal



            Chamar a atenção para a possibilidade de se argüir prescrição do crédito tributário, ou daqueles créditos a ele equiparado, por meio do conhecido expediente de defesa de pré-executividade, no bojo da ação de execução fiscal, é o objetivo deste artigo, que é uma pequena contribuição ao tema.

            Sabe-se que a Lei 6.830/80 (LEF) regula o procedimento das execuções de maior interesse da Administração Pública. Este diploma legal estabelece, por conta de seu art. 16, o “único” meio de impugnação do título executivo: os embargos de executado. Todavia, é de se observar que o §1º, do mesmo art. 16, fixa, como pressuposto de conhecimento dos embargos, a prévia garantia do juízo com o montante integral da dívida em execução.

        Diante deste fato, resulta que, por exigência legal, por mais nulo ou inexigível seja o título, para que o contribuinte se defenda da pretensão executiva da Fazenda, é imperativo ver-se privado de seu patrimônio, de forma a satisfazer o preceito contido no §1º do art. 16 da Lei 6.830/80 e, somente assim, ter sua demanda cognitiva de embargos do executado admitida e analisada em seu mérito.

           Assim sendo, na exigência acima é que reside o proveito de se estudar a possibilidade que tem o contribuinte de se defender de um Título Executivo cujo crédito esteja prescrito e, portanto, inexigível, sem que se faça necessária a constrição patrimonial exigida para a propositura regular dos embargos de executado.

         A exceção de pré-executividade consiste na possibilidade do executado promover sua defesa nos autos do processo de execução, sem necessidade de penhora e de oposição de embargos à execução. A jurisprudência admite essa medida em casos excepcionais nos quais o executado ventile questões de ordem pública, ou matérias que desde logo venham acompanhadas de inequívoca comprovação.

        Em homenagem ao princípio do amplo acesso à justiça, a partir da construção atribuída ao célebre Pontes de Miranda, a jurisprudência tem admitido a execução de pré-executividade como meio de defesa do executado, a fim de evitar uma injusta, muitas vezes insuportável, constrição do patrimônio do suposto devedor, em matérias que, desde pronto, é possível ao juízo conhecer da impossibilidade de prosseguimento da execução.

              Sob esse prisma, a matéria encontra-se pacificada na Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça através da Súmula nº 393 do STJ.

“A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória.”


DAS QUESTÕES DE ORDEM PÚBLICA


DA PRESCRIÇÃO DOS DÉBITOS TRIBUTÁRIOS


            Em síntese, a prescrição é a perda do direito à ação. Em matéria tributária, o instituto tem sede no art. 174 do Código Tributário Nacional, que assim dispõe:



Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.
Parágrafo único. A prescrição se interrompe:
I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal; (Redação dada pela LC nº 118, de 2005)
II - pelo protesto judicial;
III - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;
IV - por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor.


      O dispositivo estabelece como termo inicial para a contagem do prazo prescricional a constituição definitiva do crédito, que, consoante a sistemática do sistema tributário brasileiro, dá-se pelo lançamento.
A partir da constituição definitiva do crédito, a fazenda dispõe do prazo de cinco anos para efetivar a cobrança do crédito tributário, sob pena de extinção do crédito tributário, de acordo com o disposto no art. 156 do CTN.


Art. 156 - Extinguem o crédito tributário:
(...)
V - a prescrição e a decadência


           O instituto homenageia a segurança jurídica evitando-se que o contribuinte permaneça eternamente a espera da atividade administrativa punindo a inércia do credor fazendário. A inércia do titular do direito e decurso do prazo legal fulminam do direito da fazenda de exigir o crédito extinguindo o próprio crédito.
Assim, a questão é a fixação dos marcos temporais de interrupção, entre a constituição definitiva do crédito e o termo final no qual transcorreu o prazo previsto em lei em que o credor permaneceu inerte.


DA CITAÇÃO VÁLIDA DO DEVEDOR, TERMO AD QUEM PARA INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO

(REDAÇÃO DO INCISO I, PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 174 DO CTN ANTES DA EDIÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR Nº 118/2005)


         As hipóteses de interrupção do prazo prescricional estão elencadas no § único do art. 174 do CTN, entre elas, destaque-se o inciso I que, pela atual redação, estabelece a interrupção da prescrição pelo despacho do Juiz que ordenar a citação em execução fiscal.

      A redação do inciso I, § único do art. 174 do CTN foi dada pela lei complementar nº 118 de 09/02/2005, que só entrou em vigor em 09/06/2005. A redação anterior do dispositivo prescrevia a interrupção do prazo prescricional pela citação pessoal do devedor.

        Portanto, o regime normativo que disciplina a interrupção dos prazos prescricionais, relativamente à citação do réu, antes da edição da lei complementar nº 118/2005, é aquele que prescreve a citação pessoal do devedor.

           A discussão sobre o tema gira em torno dos prazos que ainda não haviam se consumado quando da edição da lei complementar nº 118/2005. Todavia, o Superior Tribunal de Justiça pacificou a questão. Confira-se a jurisprudência adiante colacionada:


RECURSO REPETITIVO. CITAÇÃO. EDITAL. INTERRUPÇÃO. PRESCRIÇÃO. A Seção, ao apreciar o Resp. (Res. n. 8/2008-STJ e art. 543-C do CPC), deu provimento ao recurso, determinando o retorno dos autos à instância de origem, para prosseguimento do executivo fiscal. Restou firmado que a LC n. 118/2005 (vigência a partir de 9/6/2005) alterou o art. 174 do CTN para atribuir ao despacho do juiz que ordenar a citação o efeito interruptivo da prescrição. Destarte, consubstanciando norma processual, a referida LC é aplicada imediatamente aos processos em curso, o que tem como consectário lógico que a data da propositura da ação pode ser anterior à sua vigência. Todavia, a data do despacho que ordenar a citação deve ser posterior à sua entrada em vigor, sob pena de retroação da novel legislação. Conforme a jurisprudência deste Superior Tribunal, a Lei de Execução Fiscal (LEF) prevê, em seu art. 8º, III, que, não se encontrando o devedor, seja feita a citação por edital, que tem o condão de interromper o lapso prescricional.


Da leitura da jurisprudência acima, é fácil concluir que:


1) Para as ações propostas antes de 09/06/ 2005 (data que entrou em vigor a LC nº 118), cujo despacho de citação foi anterior a esta data, vale a regra da citação pessoal do credor, antiga redação do inciso I, § 1º do art. 174 do CTN;

2) Para aquelas ações para as quais ainda não havia despacho citatório do juiz, a interrupção do prazo prescricional passou a ser disciplinada pela nova redação do dispositivo acima, dada pela Lei Complementar nº 118/2005.

TERMO A QUO PARA DA CONTAGEM PRESCRICIONAL


        O Superior Tribunal de Justiça já se posicionou no sentido de que nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, a constituição definitiva do credito, que inaugura a contagem do prazo prescricional para a cobrança do tributo é contada a partir do vencimento da obrigação ou da entrega da declaração (DCTF), o que for posterior. Vejamos:


TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. COFINS. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. RECURSO REPETITIVO JULGADO. MULTA DO ART. 538, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC AFASTADA. SÚMULA 98/STJ.
1. O acórdão recorrido analisou todas as questões atinentes à lide, só que de forma contrária aos interesses da parte. Logo, não padece de vícios de omissão, contradição ou obscuridade, a justificar sua anulação por esta Corte. Tese de violação do art. 535 do CPC afastada.
2. O entendimento mais recente jurisprudência desta Corte é no sentido de que a partir do vencimento da obrigação ou da entrega da declaração (o que for posterior), o crédito tributário já pode ser exigido, fixando, a partir daí, o termo inicial do prazo prescricional.
3. O tema em debate foi objeto de apreciação pela Primeira Seção, ao julgar o REsp 1.120.295/SP, mediante a sistemática prevista no art. 543-C do CPC (recursos repetitivos).
4. A multa aplicada nos embargos declaratórios deve ser afastada, pois os embargos de declaração manifestados com propósito de prequestionamento não tem caráter protelatório (Súmula 98/STJ).
5. Agravo regimental provido apenas para afastar a multa do art. 538, parágrafo único, do CPC.

  
            Nesse sentido, insta dizer que consta da CDA a constituição do crédito por meio de declaração, portanto, deve ser considerada a data do vencimento do tributo, constante na própria CDA, como marco inicial da contagem do prazo prescricional.

DA INÉRCIA DA FAZENDA PÚBLICA


           Em termos práticos, é cediço que as peças vestibulares nas execuções fiscais são formulários nos quais a Procuradoria insere apenas os dados do executado, o valor e origem do crédito tributário. Desta feita, não obstante o prazo qüinqüenal, o Fisco deixa para propor as ações faltando poucos meses para o transcurso do prazo prescricional, e se utiliza da Súmula 106, STJ, para que a argüição da prescrição não seja acolhida.

              De mais a mais, quando a Fazenda Pública contribui para a ocorrência da prescrição, seja quando deixa para ajuizar a execução fiscal no último exercício ou quando propõem milhares de execuções simultaneamente, não há como ser aplicada a mencionada súmula.

              Pensando nestas situações em que a Fazenda colabora com a morosidade na citação, os tribunais pátrios começaram a não aplicar a vergastada súmula do STJ, senão vejamos:


EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS. PRESCRIÇÃO. ART. 2º, § 3º, E ART. 8º, § 2º, DA LEI N. 6.830/80.
1. A regra do art. 2º, §3º, da Lei n. 6.830/80, que determina a suspensão do prazo prescricional pela inscrição do débito em dívida ativa, resta afastada pelo art. 174 do Código Tributário Nacional, norma de hierarquia superior.
2. O art. 8º, § 2º, da LEF deve ser interpretado em harmonia com os dispositivos do Código Tributário Nacional.
3. Situação anterior à nova redação do art. 174, parágrafo único, inc. I, do CTN.
4. Decorridos mais de cinco anos entre a constituição definitiva do crédito tributário e a citação do sujeito passivo, cabível o acolhimento da prescrição, não cabendo invocar a Súmula nº 106 do STJ, pois não houve demora do Judiciário no cumprimento dos atos do processo. (TRF 4ª Região – AC 200570020021343/PR – 2ª T. Rel. Min. Des. Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ. DJU DATA:22/02/2006 PÁGINA: 467) (destaque ausente do original).


            Em análise ao inteiro teor do julgado supra-mencionado, evidencia-se que a inaplicabilidade da súmula se deu quando houve culpa, ainda que mínima, da Fazenda em deixar transcorrer o prazo prescricional, como bem demonstra o voto do relator:

" Entendo que não há como aplicar ao caso a Súmula nº 106 do STJ, que afasta o acolhimento da prescrição quando a demora na citação ocorre por "motivos inerentes ao mecanismo da justiça", porque a prestação jurisdicional foi célere no caso dos autos. O que ocorreu foi que a Fazenda Nacional ajuizou a ação no último ano do prazo, faltando apenas cinco meses para a consumação da prescrição. Dessa forma, qualquer problema na citação, como acabou ocorrendo, frustraria a sua interrupção". (grifei)


Neste sentido, segue a jurisprudência do STJ:


PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL – PRESCRIÇÃO – INÉRCIA DA FAZENDA PÚBLICA – REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS (SÚMULA 7/STJ).
1. Tendo a Corte de origem decidido soberanamente pela inércia da Fazenda Pública, ao afastar a aplicação da Súmula 106/STJ, a análise de tese em sentido contrário demandaria o reexame do contexto fático-probatório dos autos, procedimento este vedado pelo teor da Súmula 7/STJ.
2. Agravo regimental improvido. (STJ – AGRESP 712647/PE – 2ª T. Rel. Min. ELIANA CALMON. DJ DATA:13/02/2006 PÁGINA:760) (grifei).


Violação ao Princípio da Segurança Jurídica


         Não pode o Fisco ficar indefinidamente sem promover a citação do executado, ao argumento de já ter proposta a execução fiscal no prazo para seu exercício, sob pena de flagrante violação a um dos maiores princípios constitucionais que é o da segurança jurídica. O executado não pode ficar a mercê da Fazenda “ad eternum”.

Nesta senda, anote-se a ilustre passagem do Ministro Luiz Fux:

 “Permitir à Fazenda manter latente relação processual inócua, sem citação e com prescrição intercorrente evidente é conspirar contra os princípios gerais de direito, segundo os quais as obrigações nasceram para serem extintas e o processo deve representar um instrumento de realização da justiça.
Como se não bastasse essa visível transgressão ao princípio da segurança jurídica, devemos considerar que, se a Fazenda não pode ser prejudicada pela morosidade da Justiça, muito menos pode ser o executado, haja vista que este, sim, não deu qualquer causa para a demora na citação.”

              Por todo exposto, o acolhimento das razões apresentadas, para o reconhecimento da prescrição pelo Juiz, representa nada mais, do que o justo tratamento ao executado, uma vez que não pode ter o seu patrimônio injustamente constrito por débitos que estejam prescritos, o que feriria certamente a segurança jurídica, princípio basilar do Estado Democrático de Direito.




Alberto Aparicio Neto

2 comentários:

  1. Vergonhosa a atuação de nosso Estado na utilização da já conhecida sobrecarga do judiciário para dilatar o prazo prescricional de sua ações de natureza trubutária.

    Apesar disto, devemos lembrar também que em nosso país ocorre também a sobrecarga do próprio Executivo, tanto pela elaboração de uma série de leis com diversas atuações estatais que são levadas a cabo pelo Executivo, como pela incorreta alocação de agentes públicos concursados ou não em diversos setores da máquina com o único intuito de acomodar interesses políticos.

    O sistema político nacional precisa urgentemente de uma reforma pois não serão em todas as situações que nosso Judiciário conseguirá intervir, mesmo que temporariamente, corrigir falhas deste porte, como foi demonstrado no presente artigo com a jurisprudência de nosso STJ.

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  2. Excelente artigo, Alberto... acredito que toda contribuição sobre a figura da exceção de pre-executividade seja bem vinda... Muito bom

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